Contos

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Jus Gentium

Toc toc
O sargento da PM bateu na porta da sala do escrivão. Trazia um casal. Um em cada mão.
- A vizinhança chamou a viatura por causa da briga dos dois, Almir. Um bafafá da pêga lá no Alto do Urubu....
O escrivão Almir olhou os dois. Uma hora da tarde, um calor infernal na delegacia de telha de amianto. Esse pessoal não tinha mais o que fazer que não impedir a sua sesta?
- Sentem aí e esperem.
Almir terminou lentamente o cafezinho. Tragou pacientemente o cigarro. Pegou um rolo de fita para a a velha Olivetti sem nenhuma pressa, olhando para o casal, forçado a se sentar no mesmo sofá.
A mulher batia o pé insistentemente, e olhava para todos os lados, menos para o homem. Ele, com um bigodinho fino, a canela suja de cal, tentava disfarçar uma cara de menino inocente, sorrindo sempre em seguida, ante a própria incapacidade de fingir. Ela puxou:
- Bandido. Ordinário..... Dotô (virou-se para o escrivão) esse féladaputa quebrou meu DVD, meu sofá e a janela. Ainda me deu uma tapona e me jogou no chão, me ralei toda, ó (mostra os supostos arranhões, que não os vê)
- Isso é uma vadia, dotô, tá mentindo....
- Mentindo o que, seu sacana? Quem te deu o direito de quebrar o meu DVD? Quem te deu o direito de quebrar meu sofá?
- E quem te deu o direito de quebrar o meu coração? Quebrar meu sentimento? Isso vale mais que o DVD. Sua puta!
Almir, então no segundo cafezinho, gritou:
- Baixe a voz, porra! Tá pensando que tá onde?
- Mas dotô, e meu direito? Essa vagabunda arregaçou meu coração, pela segunda vez! Eu perdoei ela da primeira, não dá uma semana ela me apronta de novo?
- Que direito? Desde quando corno tem direito? Ainda mais reincidente? Fiquem aí os dois sentados pensando na vida, que eu tenho mais o que fazer!
E sorveu mais um gole de café.
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(Postado no Caxassa Filosofal, em Maio de 2008)

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